Burger King vs. McDonald’s: “BK Tasty” grátis para advogados e a batalha do direito marcário

No cenário competitivo do mercado de fast-food, uma nova batalha acaba de eclodir, trazendo à tona questões fascinantes sobre direito marcário, ética publicitária e estratégias de marketing. O Burger King, conhecido por suas campanhas ousadas e muitas vezes provocativas, lançou recentemente uma promoção que não apenas chamou a atenção dos consumidores, mas também acendeu um debate acalorado nos círculos jurídicos e de marketing.

Vamos mergulhar fundo neste caso, oferecendo uma análise abrangente que servirá tanto para profissionais da área quanto para leigos interessados em entender melhor como as grandes corporações navegam nas águas turbulentas da concorrência e da publicidade.

O Caso: “That Tasty” do Burger King

O Burger King surpreendeu o mercado ao lançar uma campanha intitulada “That Tasty” para promover seus lanches. À primeira vista, pode parecer apenas mais uma promoção comum, mas um olhar mais atento revela uma estratégia meticulosamente planejada e potencialmente polêmica.

O nome “That Tasty” faz uma referência direta e inegável ao “Big Tasty”, um dos sanduíches mais icônicos do McDonald’s, seu principal concorrente. O Burger King não se limitou a uma simples alusão; a empresa foi além, exibindo propagandas em suas redes sociais que deixavam clara a comparação entre os produtos:

Mas o Burger King não parou por aí. Em um movimento que mistura audácia e humor, a empresa anunciou que ofereceria um sanduíche gratuito para advogados dispostos a provar que o “That Tasty” é bom e que não constitui uma cópia do produto do concorrente. Esta ação não apenas chamou a atenção do público em geral, mas também atraiu o olhar curioso da comunidade jurídica.

Para entender completamente as implicações desta campanha, é necessário voltar no tempo. Em 2007, o McDonald’s enfrentou suas próprias dificuldades ao tentar registrar a marca “Big Tasty” no Brasil. O Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), órgão responsável pelo registro de marcas no país, inicialmente resistiu ao pedido.

O motivo? O INPI considerou que o termo “Tasty” era genérico demais e poderia causar confusão com outros nomes no mercado. Ironicamente, o próprio McDonald’s argumentou, em sua defesa, que “Tasty” não deveria ser de uso exclusivo de nenhuma empresa, pois se tratava de uma palavra descritiva – um termo em inglês que, traduzido, significa simplesmente “saboroso” ou “gostoso”. Veja parte da petição do próprio MacDonald’s:

Após um processo de argumentação e, possivelmente, ajustes na solicitação, o McDonald’s conseguiu o registro da marca “Big Tasty”. Este episódio estabeleceu um precedente importante no mercado de fast-food brasileiro e na jurisprudência relacionada ao direito marcário.

A Estratégia do Burger King: Genialidade ou Temeridade?

Agora, anos depois, o Burger King parece ter estudado cuidadosamente este caso histórico para elaborar sua nova estratégia. A empresa optou por usar o termo “Tasty”, mas com uma pequena e significativa alteração: trocou o “y” pelo “e”, criando “BK Taste”.

Esta modificação aparentemente simples é, na verdade, uma jogada astuta no campo do direito marcário. Ao alterar ligeiramente o termo, o Burger King cria uma distinção que pode ser suficiente para evitar acusações diretas de violação de marca registrada. Ao mesmo tempo, mantém a clara associação com o produto do concorrente, beneficiando-se do reconhecimento já estabelecido do termo “Tasty” no mercado de fast-food.

Além disso, ao oferecer sanduíches gratuitos para advogados, o Burger King não apenas gera buzz em torno da campanha, mas também parece desafiar abertamente qualquer potencial ação legal. É como se a empresa estivesse dizendo: “Estamos tão confiantes na legalidade de nossa ação que convidamos os próprios especialistas em direito para analisá-la”.

Implicações Legais: Navegando nas Águas do Direito Marcário

O caso do Burger King vs. McDonald’s traz à tona questões cruciais do direito de propriedade intelectual, especificamente no que tange ao direito marcário. A Lei da Propriedade Industrial (Lei nº 9.279/96) é o principal marco legal que rege estas questões no Brasil.

O artigo 124 desta lei estabelece que não são registráveis como marca “termo técnico usado na indústria, na ciência e na arte, que tenha relação com o produto ou serviço a distinguir”. Este é o ponto central da questão: até que ponto o termo “Tasty” (ou “Taste”) pode ser considerado genérico ou descritivo demais para ser propriedade exclusiva de uma empresa?

O Burger King parece estar se apoiando justamente nesta zona cinzenta da lei. Ao usar uma variação do termo e ao fazer referência à sua própria história (alegando que o lanche originalmente era deles e que o McDonald’s teria copiado), a empresa cria uma narrativa que desafia a exclusividade da marca do concorrente.

No entanto, esta estratégia não está isenta de riscos. O McDonald’s poderia argumentar que, mesmo com a alteração, o uso do termo “Taste” em um contexto tão similar ainda constitui uma violação de sua marca registrada. Eles poderiam alegar que há risco de confusão para o consumidor, um dos principais critérios utilizados em disputas de propriedade intelectual.

Além das questões puramente legais, este caso levanta importantes considerações éticas no campo da publicidade. No Brasil, o Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (CONAR) é o órgão responsável por garantir que as campanhas publicitárias sigam padrões éticos e não causem danos aos consumidores ou ao mercado.

O CONAR tem diretrizes específicas para publicidade comparativa, que é permitida no Brasil, mas deve seguir certas regras:

  • As comparações devem ser objetivas e baseadas em fatos verificáveis.
  • Não devem causar confusão entre as marcas.
  • Devem evitar desmoralizar ou ridicularizar a concorrência.

A campanha do Burger King caminha em uma linha tênue no que diz respeito a estas diretrizes. Por um lado, a empresa não faz uma comparação direta de qualidade ou preço. Por outro, a referência ao produto do concorrente é clara e potencialmente confusa para o consumidor.

O CONAR poderia ser chamado a se manifestar sobre esta campanha, seja por uma denúncia do McDonald’s ou por iniciativa própria. Se isso ocorrer, o conselho terá que avaliar se a campanha do Burger King ultrapassa os limites do que é considerado aceitável na publicidade comparativa.

Impacto no Mercado e na Percepção do Consumidor

Para além das questões legais e éticas, é importante considerar o impacto desta campanha no mercado e na percepção do consumidor. O Burger King tem uma história de campanhas provocativas que geram grande repercussão nas redes sociais e na mídia.

Esta estratégia de marketing, conhecida como “marketing de guerrilha”, visa criar um alto nível de engajamento e discussão em torno da marca. Mesmo que a campanha eventualmente enfrente desafios legais ou éticos, o buzz gerado pode ser considerado um sucesso em termos de visibilidade e lembrança de marca.

No entanto, há riscos associados a esta abordagem. Alguns consumidores podem ver a campanha como criativa e divertida, reforçando uma imagem de marca irreverente e ousada. Outros podem interpretá-la como antiética ou até mesmo desleal, potencialmente danificando a reputação da empresa.

Além disso, este tipo de campanha pode iniciar uma “guerra” publicitária entre as marcas, onde cada uma tenta superar a outra em termos de criatividade e ousadia. Embora isso possa ser interessante do ponto de vista do entretenimento do consumidor, pode também levar a um desgaste da imagem de ambas as empresas no longo prazo.

O caso Burger King vs. McDonald’s oferece várias lições valiosas para empresas de todos os tamanhos e setores:

  • Conhecimento da história e do contexto legal: O Burger King claramente fez sua lição de casa, estudando o histórico do registro da marca “Big Tasty” para elaborar sua estratégia.
  • Criatividade dentro dos limites legais: A empresa demonstrou como é possível ser criativo e provocativo enquanto se navega cuidadosamente pelas restrições legais.
  • Aproveitamento do buzz: A oferta de sanduíches gratuitos para advogados é um exemplo brilhante de como gerar discussão e engajamento em torno de uma campanha.
  • Riscos calculados: Embora ousada, a campanha parece ter sido cuidadosamente planejada para minimizar riscos legais, demonstrando a importância de uma estratégia bem pensada.
  • Atenção à ética: O caso ressalta a importância de considerar não apenas a legalidade, mas também a ética nas estratégias de marketing.

Assim, a campanha “That Tasty” do Burger King é um caso fascinante que entrelaça direito marcário, ética publicitária e estratégias de marketing de forma complexa e intrigante. Ela demonstra como as grandes corporações estão constantemente testando os limites do que é legal, ético e eficaz em termos de marketing.

Enquanto aguardamos para ver como esta história se desenrolará – se o McDonald’s responderá, se o CONAR se manifestará, ou se a campanha simplesmente seguirá seu curso – uma coisa é certa: este caso servirá como um estudo valioso para profissionais de marketing, advogados e estudantes de negócios por anos vindouros.

No final, cabe a cada empresa decidir até onde está disposta a ir em suas estratégias competitivas, sempre ponderando os potenciais ganhos em termos de visibilidade e engajamento contra os riscos legais e reputacionais. E para nós, consumidores e observadores, resta acompanhar com interesse como essas batalhas corporativas moldam o mercado e influenciam nossas escolhas diárias.

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